Quenti Tarantino já o comparou a Steven Spielberg e admitiu que o prefere. O sul-coreano Bong Joon-ho virou um favorito do público dos festivais com filmes como O hospedeiro e Mother, mas, este ano provocou mais controvérsia do que admiração em Cannes com seu novo longa-metragem. Não que Okja não seja bom. O problema é que o filme foi produzido pela Netflix, que entrou em litígio com a organização do evento, pois o regulamento do festival exige que os filmes sejam lançados no cinema. A Netflix é uma provedora global de filmes e séries de televisão via streaming, forma de transmissão instantânea de dados de áudio e vídeo por meio da internet.
Houve réplica e tréplica e o presidente do júri, Pedro Almodóvar, foi logo anunciando que não via como um filme que não fosse para cinema pudesse ganhar a Palma de Ouro. Com isso, a fábula de Bong Joon-ho não chegou a ser vista, ou debatida, por seus méritos. Virou outra coisa: uma polêmica sobre a reserva do mercado das salas de cinema.
Tire suas próprias conclusões: Okja está disponível na Netflix. A história mostra que uma organização multinacional promete comida barata para o mundo superpopuloso desenvolvendo, geneticamente, uma espécie de porco gigante. Para fins promocionais, filhotes são criados ao redor do planeta e levados a Nova York para participar de um concurso – e ser abatidos. Na Coreia do Sul, uma criança órfã, criada pelo avô, vai se ligar ao filhote Okja. Ele cresce e fica enorme. Com a ajuda de uma ONG que defende o meio ambiente, a garota Mija vai atravessar o mundo para tentar resgatar o bicho.
Todo Bong Joon-ho se faz presente nessa história – o desequilíbrio do mundo, a importância da família e do meio ambiente, os malefícios do capitalismo em ação. Em Cannes, o cineasta mostrou uma tatuagem – caracteres orientais que significam mulher e filho. Estão gravados em sua pele.
LINCHAMENTO A atriz Tilda Swinton interpreta a CEO da companhia que produz alimentos. Seu papel é duplo, representando gêmeas, e cada uma é pior que a outra no comando da organização (criminosa?). Jake Gyllenhaal faz um desses especialistas que decifram a vida selvagem na TV. Está perdendo audiência e se deixa manipular por Tilda & cia. Existe a garota, Seo Hyun-han, que é ótima. E Okja, como criação digital.
Em Cannes, Bong Joon-ho se declarou surpreso com toda a polêmica a respeito da veiculação de seu filme. “Imaginava que chegaria aqui e participar de algum seminário para discutir o futuro do cinema. Não para ser linchado como seu assassino”, afirmou. O hospedeiro já era sobre um animal gigantesco, produto da poluição química, que devorava pessoas em terra e na água. Okja é, comparativamente, menos ameaçador, mais dócil. Sua primeira aparição o torna cativante. Evoca um pouco Dumbo, grande e desajeitado, na imortal animação da Disney.
“Os animais não têm muitas vidas no cinema. Ou são pets, preenchendo as carências afetivas dos humanos, ou vão para o matadouro. Queria que minha fábula ajudasse a lhes dar outra dimensão”, afirmou Joon-ho. (Luiz Carlos Merten/Estadão Conteúdo)
OKJA
• Dir: Bong Joon-ho
• Com Seo Hyun-han, Tilda Swinton e Jake Gyllenhaal
• 121 minutos
• Em cartaz na plataforma Netflix
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